Grande é a diferença de alcance entre nossos sonhos e nossas mãos – e talvez nenhuma ciência deixe isso tão claro quanto a Astronomia. A humanidade, que deseja chegar às estrelas, talvez não consiga mais do que criar uma raça que possa fazê-lo em seu lugar – e mesmo para isso não há garantias. Ainda assim ousamos sonhar, e o planetário – uma máquina horrorosa de feia, cujas arestas e armações de metal descoberto remetem aos piores pesadelos industrial-militares do século XX – ao nos revelar o espaço como nunca antes foi possível antes dele, nos ajuda a criar e manter esse sonho. Nossas ferramentas para persegui-lo são primitivas, ocasionalmente perigosas, e vez por outra nos perguntamos se elas valem a pena; mas são tudo o que temos.
Os sonhos da humanidade, os obstáculos em nosso caminho e o sempre presente risco de fracasso são o pano de fundo de Planetarian, uma Kinetic Novel lançada em 2004 pela softhouse Key. A clássica história de amor – pessoas de origens conflitantes que se apaixonam – é aqui vivida por um humano e uma andróide, e poucas vezes desde Romeu e Julieta o termo “tragédia anunciada” coube tão bem. Se não acredita em mim, veja por si mesmo – o programa pode ser obtido pelos canais usuais, e existe um patch criado por fãs que traduz os diálogos para o inglês – mas esteja avisado: mantenha uma caixa de lenços à mão, você vai precisar.
Se Planetarian em si é memorável, sua arte promocional é um show à parte. A ilustração de que mais gosto é a que decora este post, e que para mim é de um simbolismo raro.
A andróide que aperta uma lâmpada contra o peito representa o encontro do futuro com o passado que o precede e sustenta. Grandes corporações que hoje brincam de construir robôs humanóides, como a Sony e a Mitsubishi (esta última citada na própria ilustração, através do fictício logo “Hanabishi”), jamais seriam possíveis sem as pawa denki de ontem, as pequenas oficinas de conserto e fábricas de lâmpadas que fundaram a moderna indústria eletro-eletrônica japonesa após a Segunda Guerra Mundial. Ao mesmo tempo, um bulbo de vidro frio e frágil é companhia pobre para um abraço; como geralmente é o caso conosco, o encontro da andróide com suas origens pode ser esclarecedor, mas não é muito reconfortante.
Nós, humanos, emergindo das trevas do passado, buscamos a luz com nossas mãos, sem garantias, apenas com a esperança de que algo melhor seja possível. E mesmo se um dia nós, ou nossos sucessores depois de nós, encontrarmos esse algo, ainda estaremos em dívida com a nossa origem, os antepassados de cujos atos nem sempre nos orgulhamos, mas que não obstante estabeleceram as fundações sobre as quais nos sustentamos.
Autor do post: Xperroni
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